quarta-feira, 30 de maio de 2007

Samba de um degrau só

Vou escrever um samba pra tocar com os amigos na escada da entrada da sua casa.
Quero depois conquistar, levantar e entrar pra tomar uma limonada.
Mas não sei fazer samba nem seu lugar no mapa.
Quem sabe, antes de aprender as partituras e o pandeiro, enfim descubra onde fica seu canto, seu paradeiro. E sente na escada só pra ver se cabe a batucada.

segunda-feira, 28 de maio de 2007

Cadê a enzima?

E afinal,
o que tanto quero aprender
que não tenho mais tempo para escrever?

segunda-feira, 21 de maio de 2007

Burrico

Lá vai o burrico descendo a serra
Burrico empaca no caminho se ele é duro
Cinqüenta quilos de família e fome
- Burrico manda coice! Mandei avisar os homens.

Lá vai o burrico subindo a serra
Burrico leva o nordeste no lombo
E seu lombo à nordestina.
O retirante, a água e a esperança.
Ah, Burrico! Parece comigo quando manca.

Não entendo o porquê do diminuto.
Deveria ser, pelo menos, chamado estúpido.

quinta-feira, 17 de maio de 2007

Nascer

Na Rua Cecília tudo estava calmo e sereno como sempre. As corujas equilibradas nos postes davam o clima frio com seus ruídos de vôo. Os gatos sorrateiros andavam por cima dos muros e no cume das árvores e arbustos outros animais criavam a noite. Tudo calmo e sereno como sempre. Exceto por uma música harmoniosa que se iniciava em um ponto desconhecido do breu, mas que se dirigia à casa do Mestre Feiticeiro. Sua chegada àquele sobrado anunciava algo já muito esperado, e isso não era segredo, pois toda a natureza parou no instante em que a música pediu.
O ver da Lua estacionou no espírito da mulher de ventre barrigudo que agora adentrava como um sopro quente e aveludado no corpo da poetisa sem asas, que iluminada numa esquina apenas pela lua dum poste, se mostrava inteiramente nua.
O Feiticeiro chegou a tempo de envolvê-la e sob o olhar positivo do anjo tocador levou-a até a praça e deitou o corpo que se retorcia no colchão de grama.
No céu, algo que só ocorreria neste momento, o Sol e a Lua se uniram no manto azul para iluminar o nascimento.
Quando o Sol surgiu, os cabelos da poetisa se deram em fogo e se armaram ao redor da cabeça. A música do anjo nunca esteve tão intensa, misturando com o grito de dor e prazer que saía do corpo nu.
Por entre suas pernas abertas e as mãos do feiticeiro, acontecia o nascer. Ela pariu então, a união da música, do dia e da noite, da magia e da terra. Ela pariu o Teatro.

quinta-feira, 10 de maio de 2007

O parque de diversões

Roda gigante que gira, gira
subindo e descendo sem parar.
Pega o menino, leva para cima
até ele se cansar.

Montanha russa que causa emoção.
Olha, que fila enorme
querendo agitar seu coração!

Carrossel de brinquedo
roda, roda bem ligeiro,
tem cavalinho, tem girafa,
tem de tudo... e não dá medo!

segunda-feira, 7 de maio de 2007

Fim II

Quis sentir e não ter razão desta vez.
E fui embora
com meus anseios
e muita fome,
mais para o horizonte.

Ainda nos encontraremos nas ilhas do Pacífico!

Nas ilhas do Pacífico: montar em baleias azuis a discutir Simone de Beauvoir e a linha que colocamos no meio da nossa pintura.

sábado, 5 de maio de 2007

Meu valor

Lindos sapatos!
Linda testa e boas maneiras.
Lê Proust e Foucault.
Belo rosto e farta ceia.
Há quanto tempo minha mãe reza
para eu me casar
com moço assim trabalhador.
Ah! Mas não vou me apaixonar.
Ele combina as roupas, mamãe,
e as falas.
Ele mostra seus feitos orgulhoso
e reconta a prata!
Tem medo da morte e da vida.
Não sente fome nem sede
(nem fome de mim, nem sede de rede).

quinta-feira, 3 de maio de 2007

A quem chora ao ler

Todo dia me sai um pouco de poesia
(no papel, no dito ou na vida)
E digo o que tanto se passa
(no meu peito, meu leito): minha sina.

Todo dia me sai um pouco de lágrima.
Escapa um tanto dessa tristeza líquida,
Fica o resto dessa destreza sólida
Para se ler enfim, a beleza sádica.

quarta-feira, 2 de maio de 2007

Tabuleiro de dama

Prometi a mim mesma prometer a ti meu amor. Prometi também que seria eterno. Bobagem, eu sei. Prometi depois, com mais veemência e sucesso, não cumprir minha promessa.
Preciso assegurar a cada passo que não sei aonde vou. Marco o passo de gente chegando: vai embora e nos vemos amanhã! Vá embora e fica um pouco longe pra eu ver se sinto tua falta. Vá embora, mas volte. Volte porque sou carente. Volta e meia me volto e te beijo quente. E você se revolta e se perde. Perde para mim a luta. Lute comigo aqui. Quem sabe assim você ganha?
Beijo teu olho, olho teu corpo, molho teu molho. Vejo tua malícia e afago. E tenho um retalho de anatomias espelhadas. Retalho preto, ruivo, moreno, castanho e branco. Brando e quente, ainda quente. Formas e peles que coso com teus pêlos ainda quentes.
Percebo que me olha ternamente. Vejo amor em teus olhos mais uma vez e mais uma vez digo que cumprirei minha palavra. Acabou, acaba tudo. Frio. Acaba por dizer que é eterno. Não diga isso, nem aquilo dos teus olhos (tremo e não sei se é frio ou medo). Diga que vai embora. E depois volte, sem amor nos olhos. Promete para mim que volta! Volte com a alma vestida e o corpo nu.